A humildade dos grandes

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Humildade é virtude pouco prestigiada nesta era. Os tempos são de exibicionismo, de selfies, de escancaramento e partilha de intimidades. Exatamente os sintomas de uma sociedade egoísta, servil a interesses materiais, que vive de aparências.

Num terreno como esse, a humildade não consegue vicejar. Entretanto, os grandes homens são humildes. Um deles foi Carl Gustav Jung, um dos mais expressivos nomes da psicanálise. Erudito, provido de sólida cultura humanista, poliglota e até versado em “swahili”, um dos mais falados idiomas da África.

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Nasceu na Suíça e seu pai era um pastor protestante, que o fez interessar-se por religião. Em 1961, pouco antes de morrer, escreveu: “O homem deve sentir que vive num mundo que, por certos aspectos, é misterioso; que nele acontecem e se experimentam coisas que permanecem inexplicáveis, e não só aquelas que acontecem no âmbito daquilo que nos diz respeito. O inesperado e o inaudito pertencem a este mundo. Só então a vida está completa. Para mim, desde o princípio, o mundo foi infinito e inatingível”.

Só alguém provido de sapiência, a verdadeira sabedoria, sabe ser tão humilde. Por isso, talvez, não tenha tentado sistematizar sua obra, sempre tão deturpada e criticada por gnosticismo, psicologismo e outros ismos.

Jung reconhecia as exigências espirituais na vida psíquica, interessava-se pela história das religiões, pelo misticismo, alquimia, astrologia, filosofia. Por isso desconfiava da psicanálise que reduz o ser humano a um objeto. Muito mais do que uma cadeia causal, com análise das causas e efeitos que tornam o homem um ser complexo e, muitas vezes, atormentado, Jung pretendeu captar o sentido integral e o significado profundo da existência humana.

Ele também escreveu: “O homem moderno não se dá conta do quanto o seu racionalismo, que destruiu as suas capacidades de responder aos símbolos e às ideias sobrenaturais, o pôs à mercê do mundo subterrâneo da psique. Ele se libertou, ou julga ter-se libertado, da superstição, mas enquanto processo ele foi perdendo os seus valores espirituais de modo profundamente perigoso. Quanto mais se desenvolveu o conhecimento científico, mais o mundo se desumanizou”.

Não faria mal a leitura atenta e não preconceituosa de Carl Gustav Jung, nestes tempos em que a técnica parece ter substituído as crenças e a consciência da finitude dos seres racionais.

*José Renato Nalini é Reitor da UNIREGISTRAL, docente da Pós-graduação da UNINOVE e Presidente da ACADEMIA PAULISTA DE LETRAS 2021-2022.

 

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