Com a devida licença do uso do juridiquês, uma linguagem um pouco rebuscada, mas necessária para, em breve parágrafo, explicar as obrigações dos entes federativos (União, Estado e Municípios) no contexto da guerra contra o vírus que assola a comunidade internacional – Sars-CoV-2.
Na Ação Direta de Inconstitucionalidade n. 6343[1], o Tribunal Pleno do Supremo Tribunal Federal, em 06/05/2020, por maioria, concedeu parcialmente uma medida cautelar para i) suspender parcialmente, sem redução de texto, o disposto no art. 3º, VI, b, e §§ 6º e 7º, II, da Lei 13.979/2020 a fim de excluir estados e municípios da necessidade de autorização ou observância ao ente federal; e ii) conferir interpretação conforme aos referidos dispositivos no sentido de que as medidas neles previstas devem ser precedidas de recomendação técnica e fundamentada, devendo ainda ser resguardada a locomoção dos produtos e serviços essenciais definidos por decreto da respectiva autoridade federativa, respeitadas as definições no âmbito da competência constitucional de cada ente federativo, nos termos do voto do Ministro Alexandre de Moraes, Redator para o acórdão.
O entendimento adotado foi que a União (o ente central do Estado – representado pelo figura do Presidente da República) não deve ter o monopólio de regulamentar todas as medidas que devem ser tomadas para o combate à pandemia, restando-lhe a difícil missão de coordenação entre os demais entes federados (Estados, Municípios).
Ninguém conhece mais os Municípios que os próprios Municípios e, tanto assim, os gestores. A descentralização de competência é uma medida racionalizadora que põe o poder decisório perto de onde ocorrem os problemas da comunidade.
Assim, os Municípios foram fortalecidos em suas competências federativas para tratar de interesses da comunidade próxima na, como dito, batalha contra o vírus global.
No resumo, ficou a União encarregada das tratativas internacionais com Universidades estrangeiras, institutos de Saúde; busca por insumos de saúde no mercado global; e envio de recursos públicos para os demais entes e também aos autônomos e aos que enfrentaram dificuldade financeira durante o período de isolamento social.
Aos Estados e Municípios restaram as regras sobre limitação de mobilidade, haja vista que foi preciso fazer uma diminuição da dinâmica social, evitando o contato físico dos cidadãos e, por conseguinte, contaminações em grande escala.
Ainda neste tema, não deve ficar sem citação a MEDIDA CAUTELAR NA AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE 6.341 DISTRITO FEDERAL, decidida pelo Ministro-Relator Marco Aurélio, assim ementada:
SAÚDE – CRISE – CORONAVÍRUS – MEDIDA PROVISÓRIA – PROVIDÊNCIAS – LEGITIMAÇÃO CONCORRENTE. Surgem atendidos os requisitos de urgência e necessidade, no que medida provisória dispõe sobre providências no campo da saúde pública nacional, sem prejuízo da legitimação concorrente dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios.
Veja que os Municípios foram bastante prestigiados no combate à crise sanitária atual, cabendo-lhe uma série de medidas, envolvendo saúde pública, vacinações, fechamento/abertura do comércio, conscientização da população, etc.
O direito à saúde é classicamente apontado como previsto no artigo 196, da Constituição Federal.
O quadro, como se sabe, global, regional e nacionalmente é seriíssimo, podendo-se comparar, mutatis mutandis, à “gripe espanhola” de 1918 que também bateu em terras brasileiras, demandando ação de todas as esferas dos Poderes. A operacionalização (ou execução) de atos de gestão é importante, bem como sua coordenação, fazendo com que seja feita pelos cidadãos uma travessia espaço-temporal dura, até que uma vacina segura seja homologada pela Autoridade competente ou uma imunização importante seja verficada.
A importância, em âmbito legislativo, é tanta que, no Brasil, foi decretado Estado de Calamidade Pública (DECRETO LEGISLATIVO Nº 6, DE 2020) e sancionada a Lei 13.979/2020, esta que dispõe sobre enfrentamento da emergência de saúde pública de importância internacional.
A tais ações coordenadas: União enviando recursos, Estados atuando em suas esferas de competência, e Municípios zelando por interesses mais locais, em nome do combate à propagação do coronavírus, bem como o tratamento dos infectados dá-se o nome de política pública.
Gustavo Miquelin Fernandes